sábado, 29 de março de 2008

A invenção da crise - Marilena Chauí

Este texto vem elucidar a clareza dos fatos na política nacional depois da eleição de Lula para presidente. Marilena Chauí, com propriedade, esboça algumas razões das crises políticas no Brasil, que nada mais são do que lutas de classes. Vale a Pena ler e copiar! Prof. PC

Era o fim da tarde. Estava num hotel-fazenda com meus netos e resolvemos ver jogos do PAN-2007. Liguei a televisão e "caí" num canal que exibia um incêndio de imensas proporções enquanto a voz de um locutor dizia: "o governo matou 200 pessoas!". Fiquei estarrecida e minha primeira reação foi típica de sul-americana dos anos 1960: "Meu Deus! É como o La Moneda e Allende! Lula deve estar cercado no Palácio do Planalto, há um golpe de Estado e já houve 200 mortes! Que vamos fazer?". Mas enquanto meu pensamento tomava essa direção, a imagem na tela mudou. Apareceu um locutor que bradava: "Mais um crime do apagão aéreo! O avião da TAM não tinha condições para pousar em Congonhas porque a pista não está pronta e porque não há espaço para manobra! Mais um crime do governo!". Só então compreendi que se tratava de um acidente aéreo e que o locutor responsabilizava o governo pelo acontecimento. Fiquei ainda mais perplexa: como o locutor sabia qual a causa do acidente, se esta só é conhecida depois da abertura da caixa preta do avião? Enquanto me fazia esta pergunta e angustiada desejava saber o que havia ocorrido, pensando no desespero dos passageiros e de suas famílias, o locutor, por algum motivo, mudou a locução: surgiram expressões como "parece que", "pode ser que", "quando se souber o que aconteceu". E eu me disse: mas se é assim, como ele pôde dizer, há alguns segundos, que o governo cometeu o crime de assassinar 200 pessoas?
1) Que papel desempenhou a mídia brasileira – especialmente a televisão – na "crise aérea" ?
O que mais impressiona é a velocidade com que a mídia determinou as causas do acidente, apontou responsáveis e definiu soluções urgentes e drásticas!
No plano político, a invenção da crise aérea simplesmente é mais um episódio do fato da mídia e certos setores oposicionistas não admitirem a legitimidade da reeleição de Lula, vista como ofensa pessoal à competência técnica e política da auto-denominada elite brasileira. É bom a gente não esquecer de uma afirmação paradigmática da mídia e desses setores oposicionistas no dia seguinte às eleições: "o povo votou contra a opinião pública". Eu acho essa afirmação o mais perfeito auto-retrato da mídia brasileira!

Do ponto de vista da operação midiática propriamente dita, é interessante observar que a mídia:

a) não dá às greves dos funcionários do INSS a mesma relevância que recebem as ações dos controladores aéreos, embora os efeitos sobre as vidas humanas sejam muito mais graves no primeiro caso do que no segundo. Mas pobre trabalhador nasceu para sofrer e morrer, não é? Já a classe média e a elite... bem, é diferente, não? A dedicação quase religiosa da mídia com os atrasos de aviões chega a ser comovente...

b) noticiou o acidente da TAM dando explicações como se fossem favas contadas sobre as causas do acontecimento antes que qualquer informação segura pudesse ser transmitida à população.

c) estabeleceu ligações entre o acidente da GOL e o da TAM e de ambos com a posição dos controladores aéreos, da ANAC e da IFRAERO, levando a população a identificar fatos diferentes e sem ligação entre si, criando o sentimento de pânico, insegurança, cólera e indignação contra o governo Lula. Esses sentimentos foram aumentados com a foto de Marco Aurélio Garcia e a repetição descontextualizada de frases de Guido Mântega, Marta Suplicy e Lula;

d) definiu uma cronologia para a crise aérea dando-lhe um começo no acidente da GOL, quando se sabe que há mais de 15 anos o setor aéreo vem tendo problemas variados; em suma, produziu uma cronologia que faz coincidir os problemas do setor e o governo Lula;

e) vem deixando em silêncio a péssima atuação da TAM, que conta em seu passivo com mais de 10 acidentes, desde 1996, três deles ocorridos em Congonhas e um deles em Paris – e não dá para dizer que as condições áreas da França são inadequadas! A supervisão dos aparelhos é feita em menos de 15 minutos; defeitos são considerados sem gravidade e a decolagem autorizada, resultando em retornos quase imediatos ao ponto de partida; os pilotos voam mais tempo do que o recomendado; a rotatividade da mão de obra é intensa; a carga excede o peso permitido (consta que o AIRBUS acidentado estava com excesso de combustível por haver enchido os tanques acima do recomendado porque o combustível é mais barato em Porto Alegre!);

2) Como a sra. avalia a reação do Governo Lula à atuação da mídia nesse episódio?

Fraca e decepcionante, como no caso do mensalão. Demorou para se manifestar. Quando o fez, se colocou na defensiva. O que teria sido politicamente eficaz e adequado? Já na primeira hora, entrar em rede nacional de rádio e televisão e expor à população o ocorrido, as providências tomadas e a necessidade de aguardar informações seguras.

3) Em "Leituras da Crise", a sra. discute a tentativa do impeachment do Presidente na chamada "crise do mensalão". Há sra. vê sinais de uma nova tentativa de impeachment ?

Sim. Como eu disse acima, a mídia e setores da oposição política ainda estão inconformados com a reeleição de Lula e farão durante o segundo mandato o que fizeram durante o primeiro, isto é, a tentativa contínua de um golpe de Estado. Tentaram desestabilizar o governo usando como arma as ações da Polícia Federal e do Ministério Público e, depois, com o caso Renan (aliás, o governador Requião foi o único que teve a presença de espírito e a coragem política para indagar porque não houve uma CPI contra o presidente FHC, cuja história privada, durante a presidência, se assemelhou muito à de Renan Calheiros). Como nenhuma das duas tentativas funcionou, esperou-se que a "crise aérea" fizesse o serviço. Como isso não vai acontecer, vamos ver qual vai ser a próxima tentativa, pois isso vai ser assim durante quatro anos.

Os meios de informação e comunicação julgam ter tomado o lugar dos deuses e da natureza e por isso são onipotentes – ou melhor, acreditam-se onipotentes. Penso que a mídia absorve esse aspecto metafísico das novas tecnologias, o transforma em ideologia e se coloca a si mesma como poder criador de realidade: o mundo é o que está na tela da televisão, do computador ou do celular. A "crise aérea" a partir da encenação espetacularizada da tragédia do acidente do avião da TAM é um caso exemplar de criação de "realidade". Mas essa onipotência da mídia tem sido contestada socialmente, politicamente e artisticamente: o que se passa hoje no Iraque, a revolta dos jovens franceses de origem africana e oriental, o fracasso do golpe contra Chavez, na Venezuela, a "crise do mensalão" e a "crise aérea", no Brasil, um livro como "O apanhador de pipas" ou um filme como "Filhos da Esperança" são bons exemplos da contestação dessa onipotência midiática fundada na tecnologia do virtual.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Depois da 1ª Etapa...

Quase no final da 1ª etapa da Nova Proposta Curricular para o Estado de São Paulo pode-se observar algumas conclusões. É importante observar como as características das políticas neoliberais são sempre as mesmas. As elites acham, que pelo próprio destino, ou decorrer da história têm a incumbência de corrigir distorções (que elas mesmas criaram). Isso é transparênte no discurso da secretária da Educação. Claro que tem muito de bom no planejamento, no entanto, o que se pergunta é: porque deixaram chegar a esse nível pra depois interferir com correções quase que impostas?
Os neoliberias da social-democracia podriam olhar pro passado e fazer "mea culpa". Assim poderia corrigir melhor os erros. O primeiro passo é saber que errou. Pra que existe a avaliação diagnóstica? Esse mesma que deveria ser feita no contexto geral da educação paulista! Bom, pelo menos nas escolas serão feitas, mas diagnosticarão problemas estruturais, talvés, mais que os individuais de cada unidade. Por exemplo: excesso de alunos em sala de aula, horário extenso dos professores, má formação decorrente dos cursos mal preparados pela secretaria, baixos salários, dois empregos, etc.
Quanto ao jornal, que deve ter sido planejado com serviço terceirizado (como é do feitio dos neoliberais), uma grande quantidade de erros graxos foram observados nas edições. O formato P & B, com falhas nos gráficos, mapas, equações, títulos das aulas, textos, etc, remete a uma única observação: planejamento não pode ser feito de um dia para o outro por quem não está a par do plano.
Seria bom se imprensa e sociedade acompanhassem as mudanças. A imprensa sem atacar os docentes, poderia observar o passado das políticas públicas em São Paulo. Talvés os erros seriam expostos, e conhecendo-os planejaríamos melhor.
Alguém sempre paga pela culpa. A elite se isenta e a corda sempre arrebenta do lado mais fraco!
Observem...
Prof. PC

sábado, 8 de março de 2008

A mídia como arma de guerra

Esse artigo recebi no correio Caros Amigos. Vale a pena entender um pouco mais sobre os problemas geopolíticos na América do Sul. Prefiro ficar com o benefício da dúvida. Será que a mídia sulamericana e brasileira informam a veracidade dos fatos?
Leia:

por Izaías Almada

Se alguma dúvida existia, para muitos de nós, do papel da mídia no jogo internacional do poder, na estratégia adotada pelo capitalismo neoliberal em manter suas conquistas a qualquer preço e subjugar aqueles que não lêem na sua cartilha, essa dúvida deixa de existir quando se analisa friamente os últimos acontecimentos desta semana na fronteira entre o Equador e a Colômbia.

Um país conturbado há sessenta anos por uma luta político-militar interna, onde mais de 20 mil insurgentes em armas, FARC e ELN, disputam o poder com os sucessivos governos eleitos pela oligarquia. A Colômbia viu, em poucas horas, cair por terra a máscara de país democrático e legalista. E como sua política é determinada fora de suas fronteiras ou, provavelmente, em algumas embaixadas de Bogotá, deixou a nu a estratégia adotada por todos aqueles que não querem a paz interna no país. Ou, pior ainda, que precisam conflagrar a região, ampliar o conflito, com propósitos diversionistas, desviando a atenção para encobrir aquilo que interessa ao Departamento de Estado norte-americano.

Senão vejamos trecho de um relatório feito ao presidente Bush em 30 de julho de 2001 pelo National Energy Police Report e publicado pelo jornal The Nation: “os EUA necessitam garantir para os próximos anos o fornecimento seguro, estável e barato do petróleo”. O relatório avalia que três regiões no mundo têm que ser consideradas nessa perspectiva: o Golfo Pérsico, a Ásia Central e o Arco Amazônico andino, leia-se Venezuela, Colômbia e Equador.

Há, contudo, um significativo parágrafo na recomendação a Bush: “Caso não se consiga o petróleo por meios diplomáticos, devemos introduzir na matéria o nosso aparato militar”.

Golfo Pérsico, Irã e Iraque; Ásia Central, Afeganistão. Aqui, como se sabe, falharam os “meios diplomáticos”. O Arco Amazônico andino, contudo, está localizado no “quintal”, o que não deveria causar maiores embaraços, mas surgiram aqui dois empecilhos: o primeiro, Hugo Chávez, e mais recentemente Rafael Correa. O tradicional golpe de estado foi tentado contra Chávez em 2002, mas também não deu certo.

Idéias de soberania, independência, mercados comuns e construção de alternativas energéticas vão ganhando força entre países como Argentina, Brasil, Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua, Cuba. Cria-se a Telesur, a ALBA (Alternativa Bolivariana para as Américas) em oposição à falecida ALCA, o Banco do Sul, a Petrocaribe, onde países pobres caribenhos podem comprar petróleo da Venezuela a preço mais barato. Um pouco de solidariedade invade os números frios do comércio feito de trocas que só beneficia um dos lados, o mais rico.

Preocupado com os conflitos militares no Iraque e no Afeganistão, com as ameaças ao Irã, com a manutenção de Israel como Estado polícia no Oriente Médio, os Estados Unidos da América perceberam que, a rigor, contam apenas com um governo totalmente submisso na América do Sul: a Colômbia. E talvez já não contem, aqui no seu antigo quintal, só com os “meios diplomáticos” para conseguir o seu petróleo seguro e barato.

Como explicar para o mundo que a invasão do território do Equador pelas Forças Armadas da Colômbia, a que se pretendeu dar um caráter de surpresa, era uma ação preventiva de defesa do território colombiano? E apresentar rapidamente como prova alguns documentos “recuperados” do laptop de um líder guerrilheiro, onde se inferia que 300 milhões de dólares foram dados por Hugo Chávez às FARC, que os guerrilheiros iriam comprar 50 quilos de urânio, que Rafael Correa e Chávez tinham acordos secretos com as FARC, um vídeo onde um soldado, em plano muito fechado, conta dólares supostamente encontrados no acampamento guerrilheiro. Afinal, tudo isso justificaria a ação em território equatoriano. E era preciso que o mundo repercutisse toda a montagem da farsa rapidamente. Rádio, televisão, jornais, internet deveriam espalhar o mais rapidamente possível para as principais capitais européias e para os países da América Latina, em particular, que a Colômbia agiu contra terroristas que até urânio já queriam comprar... (Alguém aí se lembra das armas de destruição em massa de Sadam Hussein?). A mídia foi acionada como arma de guerra, como tem sido usual nos últimos tempos. E com tal violência e precisão que confunde a cabeça de muitos de nós... e chegamos a duvidar das nossas próprias convicções.

Mas em dúvida, sempre podemos nos perguntar:

De onde partiram os aviões e helicópteros que participaram da invasão do território equatoriano e que, pela posição dos disparos, vieram do próprio território do Equador? Seriam da base norte-americana de Manta, cujo contrato não será renovado por Rafael Correa no final de 2008?

Quem dispõe de sofisticada tecnologia de satélites para identificar eventuais telefonemas dados pelo líder guerrilheiro Raul Reyes?

O que foi fazer em Bogotá, dois dias antes do bombardeio ao acampamento guerrilheiro, o contra-almirante Joseph Nimmich, comandante da Força Tarefa do Sul dos EUA?

Onde estaria localizado o laboratório das FARC para enriquecimento de urânio nas selvas colombianas?

Os 300 milhões de dólares que Chávez entregou às FARC teriam sido em cheque ou escondidos em caixas de uísque?

Por quê a imprensa não deu o devido destaque à declaração de um dos últimos reféns soltos pelas FARC, em fevereiro, de que Ingrid Bettencourt, uma vez libertada, se candidataria à presidência da Colômbia?

Teriam Uribe e o Departamento de Estado norte-americano interesse na libertação de Ingrid Bettencourt?

É preciso ter paciência diante de tanta mentira e farsa. Recomenda-se a leitura do livro O Senhor das Sombras, de Joseph Contreras, sobre Álvaro Uribe.

Izaias Almada é autor, entre outros, do livro "Venezuela Povo e Forças Armadas", Editora Caros Amigos.

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quinta-feira, 6 de março de 2008

Tailândia, Pará, Brasil, entre muitas aspas, ou “A Amazônia não é um Santuário”

por Waldenir Bernini Lchtenthaler, do Pará

As notícias informam pouco. Dizem as manchetes que Tailândia “virou campo de guerra”. Virou não, sempre foi!
Tailândia é um município do Estado do Pará, localizado à 260 Km de Belém. Tem 44 820 habitantes (2003) e 4476 km2. Originou-se a partir da construção da Rodovia PA-150, na segunda metade da década de 1970. Violentos conflitos agrários acompanharam a ocupação desordenada da região, demandando a intervenção do regime militar, através do Instituto de Terras do Pará, o ITERPA, que inciou uma operação de “pacificação” em 1978. Dentre os técnicos daquele Instituto estava o oficial da Polícia Militar, Tenente Pinheiro, líder do processo de “pacificação” da localidade, elevada à categoria de município pela Lei Estadual nº 5. 452, de 10 de maio de 1988. Instalado oficialmente em 1 de janeiro de 1989, o nome do novo município foi sugerido pelo tenente Pinheiro ainda durante sua campanha militar, nos anos 70. O militar comparou a luta pela terra com a situação de guerra da Tailândia, longínquo país asiático, conflagrada ao longo do ano de 1977. A aprovação foi unânime.
Conheci Tailândia. É um lugar espetacularmente deprimente. Embora fique em meio à Amazônia, ou melhor, justamente por isso, o ar de Tailândia é irrespirável. Incontáveis carvoarias queimam a “biomassa” amazônica produzindo com mão-de-obra precarizada - eufemismo para escrava - o carvão vegetal ilegal que fornecem para a cadeia produtiva do minério de ferro, piloteada pela grandiosa Vale, aliás, a nossa antiga CVRD. Mais precisamente, este carvão vai para as “guseiras” de Marabá/PA e Açailândia/MA. As guseiras não têm licença ambiental. Nem a Vale, em Carajás, nem a Usina de Tucuruí têm. Elas não precisam. Na época em que se instalaram a lei não exigia. Pelo mesmo princípio uma fazenda que utiliza trabalho escravo desde 1880 pode continuar usando, porque na época em que a atividade se iniciou a lei permitia. Mas é assim...
Paralelo, mas não justaposto, já que perfeitamente integrado ao “setor” carvoeiro está o “setor” madeireiro – “a base da economia” de Tailândia.
Mas, em que se sustenta, por sua vez, a atividade em que se baseia a economia local? Em dois pilares: 1) Na “extração ilegal” - eufemismo para roubo – de madeira de terras públicas ou das reservas legais de áreas privadas. 2) No aliciamento dos miseráveis e desvalidos sem-terra; sem-futuro; sem-esperança; sem-orientação; sem-cidadania. Estes são assediados pelos madeireiros que lhes oferecem algum dinheiro pelas madeiras existentes, quer nos assentamentos em que os joga o INCRA, quer em terras que são instados a invadir, em troca da promessa de que herdarão a área depois de “aberta”. Muitas vezes esses posseiros ou assentados acabam assassinados pelos “parceiros”, uma vez tendo cumprido sua “missão” dentro desso processo “civilizatório” liderado pelos “empresários” do “setor” madeireiro. A “sorte” dos trabalhadores envolvidos nas etapas seguintes à extração, ou seja, o corte e processamento da madeira ou sua queima, não é muito melhor. Perderão sua fonte “honesta” e “digna” de subsistência, mais cedo ou mais tarde, já que a atividade madeireira é predatória de si própria, destruindo rapidamente a fonte de recursos de que depende: a floresta.
Bom, agora você deve estar se perguntando: mas e o Ibama? E a Polícia Federal? E o Ministério Público? Esqueça: aqui ninguém é preso por roubar madeira, ninguém é preso por vender madeira roubada; ou por desmatar.
Quem paga as multas que o Ibama aplica? Ninguém. O que acontece com a madeira apreendida? Fica no pátio do madeireiro - “fiel depositário” - até que ele consiga esquentá-la e vendê-la. Neste exato momento em que você lê estas linhas milhares de metros cúbicos de madeira roubada de terras públicas continuam descendo os afluentes do Tapajós, do Amazonas e de outros rios em balsas lotadas. A PM escolta as balsas porque às vezes acontece de os moradores de Reservas Extrativistas, tentarem, coitados, deter as balsas e apreender a madeira. Mas o custo do transporte é muito alto e os órgãos públicos, as “autoridades” não têm recursos materiais e humanos para agir, caso desejem ou venham a desejar agir. A Polícia Federal de Marabá não tem sequer um helicóptero, idem para Ibama e o mesmo para os outros municípios. Faltam efetivos para que essas tentativas de impor a lei possam ser efetivas.
Já sei, você deve estar se perguntando: o que faz o “empresário” quando a madeira acaba na região? “Vamos subindo!”, respondeu-me um deles. A noção de que a Amazônia é uma fronteira leva a esse raciocínio: para continuar a expansão econômica, basta avançar a fronteira! É por isso que temos um “Programa de Aceleração do Crescimento” e não de aceleração do “ desenvolvimento”. Para desenvolver não precisa expandir a fronteira, mas para crescer sim. Tailândia é uma imagem do presente, mas revela muito do passado e outro tanto do futuro do Pará e da Amazônia e, quem sabe, do Brasil?
As manifestações de Tailândia são respostas espetaculosas contra uma ação espetaculosa dos órgãos do Estado, para que fosse restabelecida a autoridade que realmente impera no interior Pará – a lei dos fora-da-lei. Não nos iludamos, o poder político do agrobanditismo é mais forte do que o dos amigos da floresta. Logo virão senadores da República, deputados, ministros e secretários e outros “representantes do povo” para defender os interesses desses “empresários” e os milhares de “empregos” ameaçados. Tenho medo que o presidente da República em pessoa, cercado pelos seus novos amigos, volte a discursar: “a Amazônia não é um Santuário” Na boca dele, o que isso quer dizer? Tailândia que o diga: anda mais para inferno!
“Quem nos salvará dos nossos salvadores?”

Waldenir (Nino) Bernini Lichtenthaler é antropólogo.

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